Há mais de um ano publiquei esta história, mas como nessa altura eram poucos os que me visitavam, decidi pegar-lhe de novo, retocá-la e voltar a editá-la aqui. Espero que gostem!
AS NINFAS
Fizera há pouco tempo 15 anos e meus Pais nunca me tinham autorizado saídas á noite.
Contudo, tinha um primo em quem os meus pais confiavam incondicionalmente.
Com muitas explicações acabou por conseguir autorização para o acompanhar a um jantar de intelectuais.
Este primo era de uma precocidade enorme, tendo aos 10 anos publicado um livro, o único, e cedo se tornou alguém bem conhecido quando fundou a Assírio & Alvim, que ainda hoje edita obras com enorme critério de qualidade. Era, e é, o Alvim. Acabou por se ligar ao mundo editorial e percorrer em postos de chefia quase todas as grandes Editoras Nacionais. Ainda continua no ramo.
Aquele jantar pareceu-me bastante estranho na medida em que não entendia quase nada do conteúdo das conversas que se atropelavam sobre a mesa, logo, após alguns copos de vinho que nunca bebera, quando um falecido crítico de Arte, em particular de Dança, de nome Tomáz Ribas, que era gay e tinha um fraquinho pelo meu primo, propôs irmos todos para um bar nas Avenidas Novas propriedade de um actor, que por coincidência era casado com uma professora de bailado com a qual eu tivera aulas de dança, casamento que acabou em divórcio apesar de ter restado uma enorme amizade, mas ele era inequivocamente homossexual, saltou-me logo o pézinho e com uma euforia quase infantil gritei ao ouvido do meu primo: Vamos, vamos!
Como já foi dito atrás, eu nunca bebera álcool antes. Aqueles dois copos de vinho já me tinham deixado uma ligeira névoa em volta da realidade, contudo, não a suficiente para que não recorde até hoje, o que a seguir presenciei.
Um toque na porta fez acender uma luz azul, o que me despertou a curiosidade e fez voltar para ver quem iria entrar.
Quase caí do banco onde estava sentada quando vejo entrar o Rudolfo Nureyev seguido por meia dúzia de jovens rapazes, todos, incluíndo ele, vestidos com túnicas transparentes, collants, e coroas de louros.
Pensei de imediato: - Quem me mandou a mim beber vinho! Será mesmo ele?
Cochichei para o meu primo: - É quem estou a pensar?
Ele confirmou com um discreto aceno assentivo de cabeça, fez-me sinal com o dedo nos lábios para nada dizer.
Calei-me sim, mas olhei-o directamente nos olhos com um olhar que deveria ser no mínimo esbugalhado de espanto e admiração! Tinha-o visto nas vésperas a dançar no S. Luis com a Margot Fontaine.
No palco parecera-me completamente inatingível, qual deus voando sobre montes e riachos. Agora estava diante de mim, a uma distância que se esticasse o braço poder-lhe-ia tocar, sorrindo-me e a enviar-me um leve beijo com a ponta dos dedos.
Quedei-me sem ouvir nada do que se falava na nossa mesa. Apenas devorava com o olhar tudo o que se passava em meu redor.
No entanto o que se seguiu foi bem terreno e carnal. Todos se tocavam cada vez mais, na devida proporção dos copos que iam deslizando pelas gargantas.
Mesmo a parecer algo a aproximar-se dum bacanal, aquelas ninfas brancas de braços esquálidos, mãos delicadas, nunca me pareceram raiar a obscenidade, mas sim a exibição do prazer dos sentidos.
São quase 5 da manhã! - sussurou-me o meu primo ao ouvido.
Foi como se um estalar de dedos junto ao meu tímpano acontecesse. Senti-me como uma Cinderela tardia.
Ai que os meus Pais nos vão matar! - Comentei alto demais, num pânico que me fazia tremer as pernas.
Saímos discretamente, sem que nenhuma daquelas etérias e altamente embriagadas personagens desse pela nossa ausência.
Claro que a chegada a casa não foi nada bonita, mas abstenho-me de a relatar para não provocar um aviltamento àquelas horas mágicas que vivi nessa noite iniciática e longínqua.
Teresa David
22 comentários:
Mais uma bela história da tua juventude, Teresa...
Sabe sempre bem ler-te, porque nos levas pela mão aos sitios e nos mostras os seus lugares mais aprazíveis...
Bem bonita esta história...
Quem dera que fosse eu a vivê-la!
Deve ter sido uma emoção, revivida aqui e agora...
Bjs
mais uma belíssima hisyória de memoroas. Quem teve uma vida tão cheia, nem orecisa de imventar.
Parabéns
Bjs
____
PS. Também tenho uma nova hstória
Sortuda! :-) Mais uma das tuas interessantes histórias que nos prendem até ao fim e nos deixam a sensação de termos estado ao vivo com as tuas personagens.
Que privilégio, Teresa!
Quem me dera também ter passado por experiências tão marcantes. Fazes bem tem trazer estas histórias e falares de pessoas e nomes que os mais novos com certeza não conhecem.
Beijinhos!!!
Também te vim visitar, e li ... e li ... e li! Acho q já passei por aqui antes e acho até q nos conhecemos. Não jantámos já com a Júlia na Ribeira na homenagem ao Adriano. Tenho qq coisa feita por ti :-)
Vou passando por aqui. Beijos
já a conheço, mas fizeste bem em postá-la de novo. É fascinante o universo da memória da juventude, p/ +qnd confrontado com esta figura - etéra era seu voar em palco, fosse qual fosse o bailado.
Bjs amiga. O pC ja vai em + de 48 horas de manobras. Imagia k acabei de almoçar há 12'....estive aqui a teimar com ele a ver se resovo o resolvível e se digna Trabalhar.
De manhã enviei um - UM - email k me absorveu 2h e + de 30'.....
Assim não dá.
Bjocas
...Teresa!
Que delícia de memória(s)!
Essa é a capacidade da memória: de podermos saltar para o outro lado, como a Alice, e observarmos os ausentes...
Abraços!
Rudolfo Nureyev e Margot Fontaine foram o par mais perfeito. Eles e Barishnikov são os meus ídolos no mundo da Dança.
Gostava de ter tido o prazer de os ter visto ao vivo, mas era demasiado pequena.
Adorei a tua história. Envolvente, da primeira à última linha.
Um beijo
OLA TERESA
QUE PRIVILEGIO TERES CONHECIDO ASSIM TAO DE PERTO O GRANDE RUDOLF N., SUCESSOR DE NIJINSKY...
RECORDO ME BEM DE VER NA TV O PAR MARGOT-RUDOLF, AINDA HOJE CREIO Q O MAIS PARADIGMATICO NO UNIVERSO DO BALLET.
BOM F D S APESAR DA CHUVA...
BEIJINHOS
TB ANDEI 2 OU 3 ANOS NO BALLET, 1º NO CONSERVATORIO E DEPOIS COM A RECENTEMENTE FALECIDA PROF.ª MARGARIDA DE ABREU (NO ATENEU DE LISBOA), ANTIGA COLEGA DE MEU PAI NALGUMAS RÉCITAS, ONDE ELA INTEGRAVA O CORPO DE BAILE E MEU PAI CANTAVA NA SOC. CORAL DUARTE LOBO.
Vim mais tarde...olhei a foto e pensei:não me digas que ela viu o Rudolf Nureyev! E pronto, lá estava a garotinha(!!) encantada numa noite de ninfas. E vivemos o momento contigo, da forma como no-lo descreves. Maravilha de noite, T e que sorte a tua. Se fosse hoje, pedias um retratinho? Ele era tão lindo como ela, a Margot: dois cisnes. E depois, aquela sensualidade era...altamente espiritual, uma dança de olhares e penas. Quem virá a seguir? Bjinho e bom week-end
Espantosa narrativa. Adorei ler esta, aliás adoro todas as tuas histórias e, a forma tão simples, mas bela de as contares.
Um abraço carinhoso e tem um excelente fim de semana ;)
(vou estar ausente uns tempos, mas um dia destes volto.)
Bj ;)
Não é já altura de publicares um livro com as tuas memórias?
O blog é 'pequeno' para a dimensão das mesmas.
Pensa nisso (.... no regresso....)
Desejo-te um bom fim de semana.
Beijinhos
Grande historia. Daqueleas que nunca mais esquecemos e este post é a prova.
Um abraço.
VIVA!!!
Resultou!
Beijinhos!!!
Bom dia, Teresa :-)
Que surpresa boa ter vindo ao teu blog e ter-me "deparado" com tão fascinante relato!
Viveste momentos mágicos.
Este deve ter parecido um sonho.
Que "inveja"!!! :-)))) (kidding)
Um beijo grande e um bom Domingo*
Há mais um sítio para cuscar...
http://pedagoges.blogspot.com/
Ena, grande festança. Enfim, para bacanais já dei e muito sinceramente acho-os vácuos, promíscuos e penso que denotam da parte dos intervenientes uma enorme solidão e carências afectivas.
Cumprimentos
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