sexta-feira, agosto 31, 2007



LA STRADA

Gosto dos filmes de Fellini, desde que me conheço. Ou seja, desde que a razão me deixou perceber a profundida de análise de alguns deles. Desejei ir a Roma a primeira vez que vi "Roma de Fellini", montar as potentes motas que volteiam sem parar em redor duma praça, ambicionei não morrer sem mergulhar na fonte de Trevi, qual Anita Erberg, mas particularmente guardei até hoje uma imagem do "la strada" que se passa logo no início do filme. Geralmente associa-se de imediato ao filme a personagem singular e espantosamente bem desempenhada da "Massimo". Para mim não foi essa, mas sim a de um homem esfarrapado, dependurado numa árvore, que lança um grito lancinante ao dizer: Voglio una donna!

O filme é de 1954, idade em que eu ainda mamava nas belas mamas da minha mãe, não, não estou a fazer-me mais nova, tinha 2 anos e mamei até aos 3! Vi-o pela primeira vez nos anos 60, e, confesso que não me fez grande mossa. Contudo, já pelos 30 e tal anos, ao revê-lo, aquele homem carente de tudo, que ao invés de pedir esmola na "strada", se empoleirava na árvore apregoando aos quatro ventos o seu desejo carnal, foi o que deveras me impressionou.

Serve isto para dizer que muitas das vezes que leio, seja em poesia ou prosa, alguns escritos de pessoas várias, me ocorre se não estarão de uma forma mais elaborada, a lançar o mesmo grito de desesperada solidão.

Quero com isto dizer que não se admirem caso um dia qualquer, se se soltarem os desejos reprimidos ou adormecidos, de me verem empoleirada em qualquer árvore, esfarrapada, a gritar a plenos pulmões: VOGLIO UNO UOMO!, que seria mais ao meu estilo, do que o carpir encapotado de carências sexuais.

Teresa David- foto retirada da net

15 comentários:

LUIS MILHANO (Lumife) disse...

Como em tudo, tens de aceitar, cada um tem a liberdade de escolher o seu modo de se exprimir...

Há códigos linguísticos só perceptíveis entre os interessados...

Beijos

Era uma vez um Girassol disse...

Que importa o modo como nos exprimirmos ser desta forma ou doutra, quando o que se deseja é amor, amor verdadeiro?
Gostei, gostei muito do teu texto, aliado ao cinema.
Também sou uma grande damiradora do cinema realista italiano. Fellini foi o génio!
Gosto especialmente, Teresa, da tua sinceridade sem medo de exposição.
És das minhas...
Estou a pensar voltar a África, a saudade aperta...
Com o meu pescador já vi que não vou!
Então quem sabe um dia não iremos juntas??????
Tenho uma missão para acabar lá. Quero ir buscar as cinzas da minha mãe.
Beijinhos

Luis Eme disse...

Não tens é muitas árvores no nosso concelho para o fazer, a não ser que vás para o Parque da Paz, embora corras o risco de ser confundida com alguém mais "ajuizado".. e resolvam trazer um colete de forças, porque é a única forma de diálogo que conhecem, para gente diferente....

Beijinhos.

Lusófona disse...

Olá Teresa!

Mais um belo texto!!

Não vi o filme citado, mas nem sempre entendemos o "diferente"... e o pior, nem sempre respeitamos.

Acho que cada um tem o direito de expressar seus sentimentos, suas emoções, desde que não agrida a integridade física e emocional de ninguém.

Beijinhos e um excelente fim de semana

Helena Velho disse...

Ah! Teresa! e que simples se tornaria a vida se todos fossem como tu!
No entanto, na minha opinião( que só vale o que vale...) até no grito directo de Voglio uno Uomo, duma mulher empoleirada numa árvore, há imensa subtileza e poesia...

Paula Raposo disse...

Por muito que me empoleire nas árvores e grite em alto e bom som, das duas uma : ou grito baixo demais(!), ou os 'uomos' não passam pelas árvores onde estou! Eh eh eh gostei de te ler. Beijos.

Conceição Paulino disse...

bom, depois do teu "aviso" no email em k enviaste o link vim ver qual a provocação e, minha amiga, desculpa - sei k não levas a mal, mas ainda assim devo dizê-lo - ainda me estou a rir.
e não é sorrir!
É rir.
e sabes k qnd rio,rio alto e muito
com sonoras gargalhadas. São tão
claros os diferentes gritos que por aqui ( e fora daqui ecoam) k só surdos não ouvem e creio k os, ou as próprias,saberão bem de seus gritos mais ou menos camuflados, por timidez, pudor (no bom sentido - não expor em demasia e cair na vulgaridade), sei lá, tantas razões...Mas crio que cada um/a saberá pq grita ou silencia e o k busca e pq busca. Dramático será se o não souber. Dramático para a pessoa em causa.
Cada um deve conhecer-se a si prório e buscar esse conhecimento - fundamental para manter a sanidade.
Os blogues funcionam muitas vezes como diários e aí cada um expõe-se. Faz-me lembrar o caso dos "VIP's" (ainda não descobri pq é k são V.I.P's da denominada revista cor-de-rosa. Escancaram as vidas e as portas de casa - única forma ao k vejo de se tornarem VIP'S e qnd a coisa lhes não agrada: "aqui D'El-Rei!
Um pouco como os pais da Maddie k tanto se expuseram e aos gémeos e agora k todos sentimos já k é areia demais em nossos olhos começam a ameaçar e denegrir.
O louco, lembro-o, mas não lembrava o grito; lembro Massima pela estrada fora...Doutra loucura falando em silêncio.
Os blogues têm destas coisas e mas pessoas são + passivas do k outras...
Mas k me fizeste rir, fizeste
BJOCAS

bettips disse...

E lá fui eu refrescar a memória, com essa tua ideia "da semana"!
Um circo e tartufos, tantos somos e vemos. Pavões armados dizem o mesmo. Carros desportivos a dar música para a rua... enfim! Muitas das tristezas que perpassam na net são carências afectivas, concordo contigo. Nem sempre do mesmo cariz mas sempre carências de coração. Fellini apanha o grotesco e o puro das situações, um Senhor. Que dizer de ti com tanta realidade e pureza? Se repartíssemos mais honestamente o nosso SER...
Um abraço amigo

Alexandre disse...

Gosto de toda a cinematografia italiana, ou não fosse o Cinema Paradiso o filme da minha vida. Mas mesmo antes de Tornatore já eu gostava de filmes italianos e alguns deles marcaram-me muito: ando a tentar descobrir que estreou em Portugal em Setembro de 1978, cuja história entre uma paixão entre um professor e uma aluna, se não me engano! Se tiveres uma ideia só com estas pistas diz-me!

Muitos beijinhos... e bom cinema!!!

Afrodite disse...

"Voglio un uomo!"
Conhecendo-te, vejo-te antes no calor da noite, depois de um bom e libertador tinto de verão, a cantar,

"Voglio un uomo, bello come un mattino d'estate
con la luce del sole
che capisca gli sguapdi e i silenzi, che mi possa ascoltare
e ogni notte in maniera diversa si inventi l'amore
Voglio un uomo, che mi dia tutto quelo che le altre
non riescorno a dare
la dolcezza, la passione il rispetto e il uon umore
un sorriso che esplode improvviso e ti illumini il cuore
insomma io sto cercando un uomo d'amare
Un un con il vizio della vita come me
chi ti fa trovare pronta la tua tazza di caffe
un con il gusto della vita come me
Cerco un uomo che trasformi ogni giorno che nase
in un giorno speciale"

E, se encontrasses esse Homem, aquele com o vício pela vida como tu, então serias tu a Mulher que transformaria cada dia num dia especial.

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Um texto tem muitas leituras. Apeteceu-me esta.

Um bacio

ASPÁSIA disse...

CARA MIA!!!

VOGLIERE SARÁ POSSERE?!

NÃO SEI SE DESSE MODO SE ARRANJA O PRETENDIDO... MAS PODES SEMPRE EXPERIMENTAR!

SE DER RESULTADO SEPOIS DIZ ALGO... AGORA ANDO SEM TEMPO E SEM DISPOSIÇÃO PARA "UOMINI" A NÃO SER UNS DE MUDANÇAS, ELECTRICISTAS, CANALIZADORES ;)... MAS PODE SER QUE VENHAM TEMPOS MAIS CALMOS...

VOGLIO DARTI UN BACIO ANCHE!

M. disse...

Ao teu modo... Fizeste-me sorrir. Sim, a solidão do mundo, e no mundo, é muita. O que aborrece é que a expressão dessa solidão, seja ela qual for, sirva de alimento ao vício de alguns de espreitar a vida alheia e de vomitarem palavras que não encontram eco no silêncio magoado. Tens razão : mais vale gritar no cimo de uma árvore. É mais genuíno.

Licínia Quitério disse...

Dentro de cada ser humano habita o chamamento pelo OUTRO desde o berço até à morte. Em silêncio ou em grito.

Abraço e bom fim de semana.

Jorge P. Guedes disse...

Fellini só filmou a vida!

Um grande e imorredoiro homem do cinema.

Um abraço.

vieira calado disse...

Fellini é um dos meus favoritos. Aliás, muito do cinema italiano que víamos em Portugal, antes de sermos consporcados com uma enormidade de coisa nenhuma, era da mais alta qualidade.
E tem a ver conosco. Toca-nos.
Parece que estamos a ver cenas que cá se podiam passar.
Desejo-lhe um bom fim de semana.