sexta-feira, fevereiro 29, 2008


CAMACHO COSTA

Ao ver toda a semana na SIC, o anúncio de um programa a ir para o ar no dia que fará 5 anos sobre a morte do Camacho Costa, veio-me á memória, algumas vezes que com ele me cruzei, bem como, alguns espectáculos onde entrou que me marcaram por razões diversas.


A primeira vez que o vi pisar as tábuas, era eu ainda adolescente, foi ao lado do Raul Solnado, no “Vamos Contar Mentiras”, comédia hilariante, embora prefira teatro dramático.


Muitos anos mais tarde, mais exactamente em 2001, revi-o no palco a trabalhar junto dos Artistas Unidos, companhia que muito prezo, que tem ao leme um dos homens de teatro que mais admiro, o Jorge Silva Melo, que aprendi a gostar do seu trabalho desde o tempo que fazia parte, com o Luís Miguel Cintra, do teatro da Cornucópia. Estava em cena –
OS IRMÃOS GEBOERS de Arne Sierens, encenado pelo Jorge Silva Melo. Aí era patente que o Camacho, conhecido mais como comediante, era também um óptimo actor dramático.


Algumas vezes estive com ele em bares de Lisboa, mas nunca trocámos palavra, até um dia, em que fui com o meu filho ver o Bolero, salvo erro estávamos em 2002, encenado pelo José Carretas ao Teatro Villaret.


Como gosto sempre de ir cedo para todo o lado, e, de preferência jantar fora, quando vou a algum espectáculo, entrei num restaurante logo ao virar da esquina, que bem conhecia, pois, trabalhava nessa altura na Fontes Pereira de Melo, o que me levara a já ter comido em quase todos os restaurantes da zona.


Mal entrei, abriu-se-me a boca de espanto ao deparar com todo o elenco da peça que ia ver a jantar. Entre os comensais estava uma actriz com quem privara bastante nos anos 70, e que não via desde essa altura, o que provocou um abraço efusivo entre as duas e um começar de relembrar de momentos antigos bem vividos e inesquecíveis.


Como ela nada sabia da minha vida desde essa altura fiz uma síntese de todos esses anos, nomeando de quem era filho o adolescente que me acompanhava.
Foi então que as antenas do Camacho Costa e do José Raposo, que também faziam parte do elenco se viraram do bitoque que tinham no prato, para mim, e, quase em uníssono, disseram: Ah mas conheci muito bem o seu marido!
Conversa puxa conversa, ajudada pelo José Carretas que entretanto aparecera, e, esse, sim, conhecia há bastante tempo, acabei por me sentar junto deles.


Constatei que o Camacho, além de bom actor, também era homem de grande cultura, bastante interessado na divulgação de obras de autores que gostava e que estavam por estrear, além de ser daquela simpatia natural, impossível de forjar. Daí, quando eu disse possuir em minha casa um inédito do pai do meu filho, os olhos lhe terem brilhado e dito: - Ah! Gostaria tanto de levar isso á cena!
Respondi: - Por mim não tenho problema nenhum!
Combinei, então passar pelo Teatro noutro dia para lhe entregar uma cópia do original.


Entretanto a hora do espectáculo chegou. Estava muito curiosa, porque por volta dos 20 anos, ainda tinha apanhado o Bolero com os resquícios do carisma que o tinham tornado o Bar de Alterne de eleição dos escritores e poetas. Com eles passara muitas noites de insónia, a ouvir as histórias delirantes dos criadores, a olhar as mulheres, a maior parte já prestes a murchar, e, particularmente, a ver a responsável pela casa, já com os seus sessenta e tal anos, que tinha uma enorme cumplicidade com todos os clientes, mas que estava sempre de olho nas suas meninas.
Contaram-me que nos anos 50 e 60, no final da noite, depois do convívio da palavra, de ouvir a orquestra de cegos, todos subiam ao andar de cima para comer peixe fresco, antes do regresso a casa.


Para mim, a recordação que se me colou á pele foi de uma mulher de seios agigantados, formas voluptuosas, cabelos negros, que numa dessas noites, em que viu que eu estava esgotada, com os olhos a entrelaçar-se no nariz, me encostou ao seu colo, proporcionando-me um sono aconchegado e maternal.


Mas voltando ao outro Bolero, gostei da peça, embora não tenha reconhecido o espaço que habitara.
No final, como me tinham convidado ao jantar para ir aos bastidores, ainda estive lá com o meu filho mais de uma hora em conversa amena com os actores e encenador.


Resta dizer que fiz as cópias da peça inédita, mas por um motivo ou outro, atrasei-me a ir ao teatro, a peça saiu de cena, o Camacho entrou na derradeira espiral de trabalho em TV, que creio, só assim, fez com que passasse a ser um actor conhecido por todos, pois, sem dúvida, neste País um actor para ser reconhecido tem de passar pelo pequeno ecrã.
Três meses antes de falecer ao ouvi-lo ser entrevistado, onde evidenciava uma rouquidão enorme, um arrepio percorreu-me a espinha, levando-me ao ano de 1994, em que o Pai do meu filho também enrouqueceu. Três meses depois faleceu de cancro pulmonar, tal e qual como aconteceu ao Camacho Costa.


TERESA DAVID-fotos recolhidas na net



sexta-feira, fevereiro 22, 2008

O POETA AÇORIANO

Em 1970 fazia-se óptimo teatro na Casa da Comédia, o que me levava a deslocar-me amiúde até lá, a fim de não perder pitada da sua programação criteriosa e corajosa para a época em que estávamos.
Aí vi teatro para adultos pela primeira vez. Nunca esquecerei uma peça que se tornou, na altura, algo ininteligível para mim. Tratava-se do FIM de António Patrício, representada e encenada pelos Bonecreiros. Fui sozinha e ainda por cima fiquei sentada dentro do palco envolvida por uma acção que não entendia. A segunda já consegui entender na íntegra, apesar de elaborada tinha tudo a ver com o meu sentir, tratou-se de Mulher Precisa-se de Almada Negreiros, encenada pela Fernanda Lapa, espectáculo que me emocionou e encheu as medidas.
Mas dizia eu que, em 1970, subiu á cena naquele Teatro uma peça que se me tornou inesquecível, A Dança da Morte em 10 assaltos de August Strindberg, não só pelo argumento, pelas fantásticas interpretações da Cármen Dolores e Augusto Figueiredo, já há muito falecido, mas também pela conversa que assisti após o final do espectáculo com o saudoso Vitorino Nemésio de quem já lera o Mau Tempo no Canal que muito apreciara.
Fora com uma amiga a quem chamava tia, apesar de não termos vínculos familiares, mas que não tendo sido mãe, construiu comigo uma amizade e cumplicidade que me ficou para o resto da vida na memória. Há muito faleceu, pois tinha mais 40 anos do que eu. Contudo, foi uma das amigas que mais me marcou pela sintonia dos nossos interesses, a facilidade com que com ela dialogava e também algumas reprimendas que me foram muito úteis.
Ora, a Tia Isaura tinha estado a viver dois anos nos Açores, uma vez que, o seu marido Coronel, aí fora colocado, alguns anos atrás, na Base dos Açores.
Logo, quando fomos apresentadas ao Nemésio, alguém que só conhecia da TV desses programas fantásticos, mas que, a minha tenra idade quando os vi, os tornavam quase incompreensíveis e, ela referiu o facto, ele de imediato esticou o dedo e na sua forma particular de se exprimir com tanta expressividade lhe perguntou:
AH! Então de certeza que conheceu a minha prima Micas!
A Tia Isaura engasgou-se, mas como mulher educadíssima que era reprimiu o riso daquela espontaneidade e apenas respondeu:
Sim, talvez tenha conhecido, mas só pelo nome é-me difícil de dizer!
Ele tergiversou de imediato para a analise da peça, contou-nos inúmeras historias açorianas, enquanto eu, me limitava a estar calada que nem um rato a sugar aquelas mãos que também falavam, os lábios carnudos que se movimentavam esticando-se ou comprimindo-se amiúde, o corpo tapado com um fato mal amanhado e a melena negra que lhe esvoaça na cabeça a cada gesto.

Teresa David-Imagem recolhida da Net

segunda-feira, fevereiro 18, 2008


EPILOGO OU CURTA PASSAGEM POR TANGER

Quando chegámos a Tânger, saídos do Ferry Boat, bastante confortável, e, após uma vistoria cerrada ao carro, onde uma curiosidade ocorreu, porque, como mulher condutora, sou cuidadosa, mas caótica em alguns pormenores, daí ter na bagageira um saco de rebuçados de menta, já derretidos pelo calor, que os fiscais enfiaram na cabeça se trataria de qualquer droga. Acabei por pegar no saco, tirar o papel colado sobre um rebuçado que já não era mais do que um matéria viscosa, passá-lo para a mão do Guarda Fronteiriço só para chatear e sujá-lo todo. Surtiu efeito, porque com a mão colado ao rebuçado nos fez sinal para seguirmos!
Alguns quilómetros adiante, com a barriga já a dar horas, vimos um restaurante com bom ar, que no exterior tinha um parque infantil e um camelo que servia somente para a fotografia. Pormenor importante a reter: Foi o único camelo que vi em Marrocos.
Logo não poderia deixar de posar junto dele. Foi nesse restaurante que comi a primeira Tágide da minha vida e também, convenhamos, a melhor confeccionada, o que me fez pensar que fome não iria passar por aquelas bandas. Tanger foi uma grande desilusão, talvez ainda maior que Rabat. Como primeira cidade que visitava não esperava encontrar a imundície que vi e as minhas narinas também, ficando mesmo á beira do vómito. Mais tarde acabaria por me habituar que cada vez que nos aproximamos de uma cidade um cheiro pútrido inunda o nosso olfacto, provindo das carnes expostas ao sol, nos vários mercados.
Com o desanimo daquela abordagem citadina, nem saímos do carro, seguindo rapidamente para Rabat.
Resta acrescentar que os Ferry Boats não só são cómodos como têm bons restaurantes e bastantes lojas, em especial, ourivesarias, onde vendem as pérolas majorica, mas, igualmente, no regresso nada comprei. No percurso, ao longe vi Gibraltar. Nenhuma vontade de visitar o rochedo me surgiu, até porque, sempre o liguei ás maiores trapaças, ou não tivesse eu trabalhado tantos anos num Banco! Como balanço ficaram-me até hoje na recordação como os momentos mais interessantes, a cascata, as ostras, apesar do incómodo que tive depois, o exotismo de Marrakech e sem dúvida, Casablanca.
Creio que não voltarei a Marrocos, pois tantos outros sítios chamam a minha atenção. Contudo, ainda gostaria de ir á Tunísia, que me parece ter zonas históricas riquíssimas para visitar, praias calmas e com águas quentes, ao invés das que encontrei em Marrocos, banhadas pelo Oceano, impossíveis de lá meter o pé, por serem agrestes, geladas e talvez correr riscos de apanhar algum cadáver a flutuar!

Teresa David

terça-feira, fevereiro 12, 2008

EL JADIDA OU LA CITÉ PORTUGAISE

Para minimizar o desapontamento que Rabat tinha sido, foi bom esbarrar na Cité Portugaise, que nunca poderia deixar de visitar, a par de Mosquée, terriola bem pequena mas com o mercado mais limpo e arranjado que vi em toda a viagem, apesar de nada ter comprado.
Em Marrocos, como amiúde já citei, surgem como se de fantasmas se tratasse, homens para nos ajudar a perceber os sítios, e, claro, para nos servirem de guias. No entanto, apenas em Marrakech pagámos a um cicerone.
El Jadida, foi fortificada e habitada pelos portugueses no início do século XVI. Curiosamente, até hoje, os marroquinos guardam uma ternura por nós, vá-se lá saber porquê, porque invasor é invasor! Ao contrário têm um desdém imenso pelos Espanhóis. Contudo, a nossa marca permaneceu nessa cidade, onde pude ver canhões portugueses, a cisterna construída por nós, várias referências ao nosso País, como na citada cisterna e um salão de chá com o nome “La Portugaise”, onde bebi aquela admirável poção de menta que me põe de bem com o estômago e o Mundo. é curioso o pormenor deste postal da cisterna por ostentar uma guitarra como simbolo de Portugal
No ano passado aquando das minhas andanças pela Andaluzia consegui adquiri-lo em Granada e tenho poupado ao máximo para esticar o prazer de o ingerir por bastante tempo, até porque, não sei, quando poderei voltar a comprá-lo.

Teresa David-fotos minhas

sexta-feira, fevereiro 08, 2008



RABAT
Apesar de ser a Capital de Marrocos, foi de longe a cidade que achei mais desagradável, salvo um ou outro pormenor que a seguir contarei, por inesperado e diferente de tudo que já vira.
A cidade é fortificada, logo á entrada pareceu-me que seria bela, mas não. O cheiro exalado da zona do suck era pestilento e a miséria visível em cada esquina que cruzava.

No entanto, o centro, onde fiquei instalada num hotel que no terraço tinha uma vista panorâmica sobre a Avenida que dominava a cidade, com a Mesquita no topo dela, era aprazível e confortável, com bons restaurantes e esplanadas a contrastar com outras zonas bem cinzentas e sujas.
O Mercado nada tinha de especial, aliás, nada comprei em Marrocos, salvo uma túnica bem fresca para enfrentar o deserto. Nas feiras do Artesanato em Portugal, nos stands marroquinos tudo é mais barato do que in loco, onde tentam esfolar os turistas até ás entranhas. Talvez também tenha ficado mal impressionada com os mercados, não só pelo cheiro e sujidade, mas também porque dei uma queda feia que só por milagre não me deixou partida aos bocados!

Rabat tem praia e reside aí a única particularidade da cidade. Dum lado poder-se-á apanhar sol estendido na areia ou numa esplanada agradável, mas mesmo ao lado, passando uma amurada, deparamo-nos com o cemitério na areia, coisa que nunca pensei existir em parte nenhuma do Mundo! Mas em Marrocos, pelo menos em Rabat, os mortos tal como os namoros de verão ficam enterrados na areia, o que me pareceu, seria pouco respeitoso, espojar-me de bikini sobre o que deles resta.

Daí ter sido uma visita quase relâmpago onde apenas ficámos de um dia para o outro, zarpando rapidamente rumo a Casablanca que era a próxima no novo roteiro marroquino.

Teresa David-fotos minhas