terça-feira, março 28, 2006



Usar uma máscara pode não ser esconder a nossa cara, mas sim mostrar a que os outros querem ver!

Teresa David



A chave do problema...
















foi por água abaixo!

segunda-feira, março 27, 2006


PLANETA DE TODAS AS CORES
Alegria em vermelho
não é sangue, é vida
Alegria em verde
é pradaria
Alegria em amarelo
é luz
Alegria em roxo
é desistir
Alegria com negro é escolha
Alegria em azul
não é céu, não,
é água límpida
Alegria mesmo, é misturar todas as cores,
e encontrar o matizado da igualdade
neste planeta que habitamos
Teresa David

domingo, março 26, 2006




Entre o tubarão do mar, e o tubarão do dinheiro, prefiro o primeiro!

Teresa David






Ao tentar vislumbrar, ao microscópio, a beleza interior de alguém, apenas consegui avistar uma caveira!

Teresa David




Dentro de um livro de alguém pode-se encontrar um Mundo,

mas ao escrever um, encontra-se uma das razões para estar vivo!

Teresa David




Cortar o fio ao balão, e vê-lo subir no ar, é sentir a sensação de uma liberdade espacial!

Teresa David

segunda-feira, março 20, 2006


O TALENTO
Esquálido,
no encovado das faces esconde os beijos
Em cada metamorfose transpira entrega
Homem de mil caras tornadas uma,
a da ternura que lhe pinga
por todos os poros do corpo
Teresa David - dedicado a um amigo talentoso actor das noites


O VIÚVO

Nas minhas deambulações nocturnas ao longo de quase toda a vida muitos sítios percorri, e de entre eles, nos finais dos anos 90 escolhi nas Docas o Queen's, ás terças feiras, por ser Lady's night, logo poder beber a meu bel-prazer á borla, pelo simples facto de ser mulher. Como o dinheiro nunca abundou na minha bolsa esse privilégio dava-me jeito.

Numa dessas 3as feiras, lá rumei Queen's adentro, abandonei num canto a mala e o casaco, sempre poupava no bengaleiro, e todo o mulherio fazia o mesmo, e atirei-me, como sempre, para o meio da pista para dançar, comigo própria, de preferência.

Ora, nesse dia específico de 1999, apercebi-me que uma roda de homens jovens me tinha rodeado, apesar das miúdas giras e muito mais novas que por lá proliferavam. Mas talvez pela forma como danço, com o diabo no corpo, como costumo dizer por graça, assim aconteceu.

Dois deles ofereceram-se para irem ao bar apinhado de gente buscar-me uma bebida, e embora um pouco desconfiada, entreguei-lhes o meu gratuito copo nas mãos. Voltaram com um Gin que bebi de um trago.

Como um se destacara, talvez pelo seu olhar mortiço, pela altura desmesurada do seu corpo, dei-lhe mais atenção, e acabei por me encostar ao balcão para trocarmos palavras gritadas ao ouvido. Soube então que a sua expressão triste se devia a ter uma companheira mais velha, muito mais velha mesmo, ou seja, deveria ser da minha idade, com um cancro da mama dos que matam.

Pensei: - Este está a dar-me uma "cantada" para molhar o bico, e limitei-me a abanar a cabeça com um olhar falsamente solidário.

Contudo, a manhã tapou a noite, e ao sair de lá com dificuldade em encarar a luz, qual morcego, trocámos números de telefone.

Passaram quinze dias, e já aquela noite tinha passado para a zona do esquecimento, quando o meu telemóvel tocou, e uma voz desconhecida me interpelou: Lembraste de mim? Do Queen's?

Ah! - respondi - eras o rapaz que tinha a mulher muito doente!

Sim, sou eu ...- e rebentou num soluçar de perder a respiração - ela já morreu há dois dias, queres vir jantar a minha casa pois sinto-me muito só?

Fiquei queda e muda, mas como achei que seria quebrar a minha natureza não dar um pouco de calor humano e simpatia a alguém que, ou era um grande mentiroso, ou sádico por inventar tal macabra história para se encontrar comigo, aquiesci, e no Sábado seguinte rumei até casa dele.

Ao entrar deparei com uma sala cheia de trabalhos em vidro Tifanny que me chamaram a atenção, e logo perguntei: Que bonito! Compraste?

Não, era ela que os fazia, também era artista como tu!

Era um bom cozinheiro e tinha feito um franco de fricassé, que acompanhámos com um bom tinto, e conversa agradável.

O jantar acabou e ele pediu-me para ir até ao quarto. Ao entrar deparei com uma parede cheia de pregos de onde pendiam inúmeros colares. No chão vários pares de sapatos por estrear. Numa prateleira ao lado da cama jaziam vários perfumes, por abrir, em frascos de vidro colorido com formas exóticas.

Disse-me: - Tu deves calçar o mesmo número que ela, se quiseres aproveita os sapatos que estão completamente novos, os perfumes, e os adornos.

Nunca me habituei a que me dessem presentes, pois sempre fui mais de dar do que receber, e de qualquer forma aquilo soava-me a macabro, ao fim ao cabo estava a ser a herdeira de uma morta desconhecida. Mas pensei: - Antes para mim que aprecio estas coisas, do que ir para o lixo, e escolhi as que mais me agradavam.

Tudo isto me parecia estranho e não deixava de me perguntar: Porquê eu? Ele é um rapaz bonito, porquê eu?

E de repente descobri duma forma abrupta quando o meu olhar circulou por toda a superfície do quarto. Sobre a mesa de cabeceira jazia a foto dela, mais exactamente da sua cara em grande plano. Vi os meus olhos, as minhas maçãs do rosto, os meus lábios, a cor do meu cabelo. Eu era uma completa sósia dela, e então percebi que o que ele queria mesmo era continuar a ter a mesma mulher através da minha imagem.

Perplexa fixei-o e nada disse. Tudo aquilo era demasiado estranho para eu continuar ali. Agradeci com um fugaz beijo na cara o óptimo jantar que fizera para mim, os presentes, peguei na trouxa, e desapareci até hoje.

Teresa David

sábado, março 18, 2006


AS NINFAS
Tinha 15 anos e absoluta e total proibição de sair de casa á noite.
Mas tinha também um primo, em quem meus pais confiavam incondicionalmente, e com o qual me deixaram ir a um jantar de intelectuais. Depois de muitas palavras incompreensíveis para mim à época, e alguns copos de vinho, um falecido crítico de Arte, em particular de Dança, cujo nome, como algumas outras pessoas que a seguir mencionarei não direi, propôs que fôssemos todos a um bar nas Avenidas Novas propriedade de um actor, que por coincindência era casado com uma antiga professora de bailado minha. Acabaram divorciados, permaneceram grandes amigos, mas ele era irremediávelmente homossexual, o que nunca deu muito jeito para alcançar um casamento feliz e duradoiro!
Eu nunca tinha bebido alcóol antes, e os dois ou três copos de vinho já me tinham deixado uma ligeira névoa em volta da realidade, contudo, não a suficiente para ter esquecido até hoje, o que a seguir presenciei.
Um toque na porta que fez acender uma luz azul, despertou-me a curiosidade adolescente, e voltei-me para ver quem iria entrar.
Quase caí do banco onde estava sentada quando vejo entrar o Rudolfo Nureyev seguido por meia dúzia de jovens rapazes, todos, e incluíndo ele, vestidos com túnicas transparentes, collants, e coroas de louros. Pensei de imediato:
- Quem me mandou a mim beber vinho! Já estou a ter um delírio!
e cochichei para o meu primo: É mesmo ele?
Ele confirmou com um discreto aceno assentivo de cabeça e fez-me sinal com o dedo sobre os lábios para nada dizer.
Calei-me sim, mas olhei-o directamente nos olhos com um olhar que deveria ser no mínimo esbugalhado de espanto e admiração. Tinha-o visto nas vésperas a dançar no S. Luis com a Margot Fontaine, no palco parecera-me completamente inatingível, qual deus voando sobre montes e riachos, e agora estava diante de mim, sorrindo-me e enviando-me um leve beijo com a ponta dos dedos.
Quedei-me sem ouvir nada do que se falava na nossa mesa a devorar tudo o que faziam.
O que se seguiu foi bem terreno e carnal, pois todos se tocavam cada vez mais na devida proporção dos copos que iam ingerindo.
Mesmo a parecer cada vez mais um bacanal, aquelas ninfas brancas de braços esquálidos, e mãos delicadas, nunca me pareceram raiar a obscenidade, era somente o prazer dos sentidos.
São quase 5 da manhã! - sussurou-me o meu primo ao ouvido.
Foi como se um estalar de dedos junto ao meu tímpano acontecesse.
Ai! Os meus pais vão-nos matar! - comentei mais alto do que devia, num pânico que me fazia tremer as pernas.
E saímos discretamente, sem que nenhuma daquelas figuras etérias e altamente embriagadas desse pela nossa ausência.
Claro que a chegada a casa não foi nada bonita, mas abstenho-me de a relatar para não provocar um aviltamento áquelas horas mágicas que vivi nessa noite iniciatica e longínqua.
Teresa David

domingo, março 12, 2006


FILHO GRANDE
Quando dos olhos o mel baba
os colibris vêem beijá-los.
Quando nos braços o triunfo do arco se aperta,
pode ser abraço, violência ou defesa.
Quando o olhar se ausenta, o deixa a vogar
nos territórios só por ele conhecidos,
É a guerra e a paz, o conflito interior,
mas mesmo eu estando cá fora
tem lá dentro, sempre, o meu Amor
Teresa David/2006 (A Mãe)
VIAJANTE

Corri Mundo nos corpos que amei

Em África agarrei o Leão

Conheci o negro cetim

Da Ásia retive os odores perfumados da Seda

Pela Europa fui da alvura do Leste

ao Latino tisnado da pele

Agora estou a descansar

até outro voo apanhar!

Teresa David/2006 - quadro de Redon

quinta-feira, março 09, 2006

A PROPÓSITO
Aninhei-me em cada ruga tua
fiquei presa ás tuas palavras
Nos momentos líquidos
nos encontrámos
Fizemos um filho por descuido
Na morte falada nos separámos
Nos sonhos te reencontro
e no Além de novo ficaremos juntos?
Teresa David


Talvez pelo Fanha ter falado no jantar dele, talvez por ter sido o único homem que realmente amei, talvez por ter vivido 13 anos fantásticos, para o melhor e pior, talvez por ter um filho dele que adoro, talvez por só ter escrito poesia a 3 meses da Morte aqui vão 2 poemas dele dos únicos 6 únicos que escreveu, pois a sua obra foi a prosa e o teatro.

CANÇÃO NOCTURNA
Hesitei na escolha, cresceu a dúvida,
Mas sou como sou, um caso que faz fumo.
Quem dera que fosse crente, era bom,
Sou apenas um poço rodeado de olhos.
Vejo o mundo como quem vê o líquido,
Durmo enterrado na erva vermelha,
Minhas mãos são algas tacteantes
E o que percorrem tem a cor da água.
No fundo é isso, o castelo é transparente,
Tem linhas vagas, não pode sobreviver,
É um labirinto com saída gradeada.
Nunca saberei o que sou, fumo e chega.
Mas não estou no final, não estou, vivo
Com um pé no eixo, outro na margem, nado
Num mar pleno de cabeças, tu e tu e tu,
Nomes com rostos visto ao longe, de longe.


A NOITE SABE
Preciso da noite para ser poema,
Da hora tardia para ser o outro eu,
Da palavra emergir dentro de mim,
De estar só como a estátua do jardim.
Tarde comecei, no final dos meus dias,
No termo da viagem, a noite sabe,
O Vírgilio branqueou, o guerreiro foi-se,
No túnel da morte é o sinal esperado.
Na noite vejo a maçã encarnada,
Polposa na fruteira, cofre de memórias,
Saindo uma a uma, visões, imagens,
Rostos diluídos, são antigas histórias.
Sei, recordar é não ver quem vive,
É percorrer gastos empredados
Apostar errado, perder.


Vírgilio Martinho - Verão 1994 a 3 meses da Morte

segunda-feira, março 06, 2006


PAI
Como tu fui amante de Eça
Devota de Camilo

Caminhei pelas fábulas das noites
Aprendi sentidos e escutei silêncios

Visitei planetas
tropecei em estrelas

Perdi-te e reencontrei-te
para te voltar a perder

Teresa David - foto de meu pai aos 10 anos com a irmã mais velha (1914)

sexta-feira, março 03, 2006

O MERGULHO

Tentei mergulhar no mais profundo de mim, e sufoquei!

Assustada, permaneci á tona na área da superficialidade.

Revesti-me duma máscara.

Lentamente, arriscando o trauma da primeira experiência náutica, voltei a mergulhar.

Metro a metro vasculhei.

Descobri vegetação vivaz e colorida.

Quase não consegui livrar-me dos limbos que me prendiam ao fundo.

Arfante resisti.

A pouco e pouco iniciei a subida, fazendo a descompressão.

Alcancei o topo.

Povoei, enfim, a superfície com a natureza trazida das profundidades.

Teresa David/anos 80 - quadro de Magritte




Vasculhar o passado e nada recordar, é o mesmo que atravessar um deserto sem encontrar um óasis!

Teresa David


BALÕES

Soprem, soprem, até eu rebentar como um balão!

De mim sairá somente o vazio dos sentidos

O zumbido do ar

Já gente não sou
nem sequer indiferente

guardei o ar do sentir
na cova da face

Nos olhos vazios
por detrás do arrepio

Nos olhos brilhantes,
escondidos por elefantes
de raiva contida

Assumida

Já não vivo
estrebucho apenas,
com as mãos abertas
para apertar o deserto.

Sem nada de concreto
a não ser o desânimo,
e talvez o resquício
da vontade de estrangular
o tempo e o pensamento,

mas apesar de tudo
manter-me como sou!

Teresa David